quinta-feira, 10 de junho de 2010

#13

livraram as navalhas das mãos dos assassinos.SIM, LIVRARAM. não se sabe como e nem o porquê,
mas as navalhas tomaram vida e desvincularam-se do polegar opositor,da palma e da raiva e também
do que os humanos chamam de justiça. sem moral, sem pudor, sem responsabilidade, as navalhas
caminhavam aos bandos pelas escadas do prédio, fumando cigarros vez ou outra, cansadas do jugo
que colacaram sob suas lâminas depois de tantos assassinatos em suas fichas. era uma cena bela,
os seres inanimados finalmente LIVRES e com vontade própria, desvinculados do grande aprisionador
que é o homem. e não como as mãos humanas que sempre se confrontaram, as navalhas andavam juntas,
todas elas tinham algo em comum, a prisão, a culpa, o sangue que não era delas, isso as unia
até ao fio e juntas andavam pelas escadarias, empunhando espadas de tabaco , entornando cerveja,
vacilando nos degraus à busca de sangue e vingança. elas queriam ter de volta o que lhes fora roubado,
mesmo sabendo que a vingança nunca é plena, havia a ciência de que acertar a conta era necessário. enfim
encontraram uma criança que brincava pululando nas escadas sem querer chegar em nenhum andar, e num ímpeto
furioso, as cem navalhas que desciam as escadas voaram no pescoço daquela criança. fez-se silêncio. o sangue
tatuou os degraus enquanto os grunhidos da criança voltavam a preencher o ar que logo em seguida dominou-se pelo silêncio.
certas de si, as navalhas encheram novos copos de cerveja e acenderam outros cigarros. sem culpa alguma. tudo fazia sentido.
era uma criança a afogar-se no sangue? ERA!!! mas o que são as crianças para os homens? nada mais do que um baú onde será depositada
ao mesmo tempo a chance ínfima de acalentar os desacertos humanos e a certeza de que será ela a pagar pelos erros de quem a pariu.